O documentário "One Shared House" produzido pelos designers Anton Repponen and Irene Pereyra, fundadores do Studio Anton&Irene, descreve os processos de mudança e vivência em uma casa compartilhada em Amsterdam. O filme foi inspirado pelo fato de Irene ter vivido parte de sua infância, entre o fim dos anos 80 e início dos anos 90, em um complexo de co-living destinado a mulheres em Amsterdam.

A decisão de viver em um espaço com essa configuração surgiu quando sua mãe buscava um apartamento para alugar no centro de Amsterdam, e devido às dificuldades de encontrar um local adequado com valor acessível, foi atraída por um anúncio que buscava “mulher solteira com filho para viver em uma casa compartilhada”. O espaço era chamado Kollontai, em homenagem à Alexandra Kollontai, e reunia pessoas e famílias de diferentes formatos. Neste caso específico, existia uma motivação feminista e anarquista, mas cada complexo de casas tinha uma configuração única e ideais distintos.

Segundo Irene, “viviam na casa uma mulher solteira; um casal de lésbicas divorciadas com um casal de filhos, a nova esposa de uma das mães separadas, a nova namorada da outra mãe, que construiu também um estúdio de pintura no espaço. Uma mãe solteira que trabalhava na maior união trabalhista da Holanda. Entre outras, o total de 12 pessoas viviam ali. A composição da casa refletia o momento político que a Holanda e Europa viviam”.

Como parte do documentário, outras diversas mulheres que viviam no Kollontai foram entrevistadas e, entre os relatos, estão alguns que descrevem uma vivência e experiência muito novas para todas as que ali viviam de compartilhamento da residência entre pessoas muito distintas.

Dentro de comunidades nesse formato, é esperado que cada adulto colabore com um mínimo de horas e atividades em prol do bem-estar comum. Cada comunidade define as próprias regras e não há um modelo único a ser seguido.

Descrevem que tomavam decisões colaborativas e baseando-se em consenso. Tinham reuniões mensais na casa, e muitas vezes escreviam cartas às outras moradoras. A dificuldade que surgiu nesse momento, foi o fato de não existir uma gestão centralizada, ou ninguém no comando. Mesmo sendo algo fundamental para elas, existia uma dispersão de responsabilidades.
Outros desafios foram encontrados, e a vida coletiva sofreu diversos problemas, mas os que ficam em destaque foram os problemas de gestão coletiva e convivência entre as moradoras,ainda que quase sempre eram encontradas soluções possíveis para a convivência em grupo.

"One woman got so fed up with her floormate that she moved all her belongings into the common room. The other house members, who hadn’t approved the move, retaliated by evicting her. Things got so heated that the police had to be brought in to resolve the standoff. A proposal was made to split the group in half, which would have required significant renovations and effectively killed the communal dream. Shortly before the meeting to discuss the measure, however, one of the feuding floormates moved out, and so the house remained intact, and morale, which had hit an all-time low, was restored." - Transcrição de entrevista do documentário

Um exemplo citado por uma as antigas moradoras do espaço, aconteceu em relação à gestão financeira da casa. Segundo ela, a princípio, uma moradora ficou responsável por administrar todas as contas e receber o pagamento de todas da casa. Com o tempo, porém, muitas vezes houveram atrasos nos pagamentos e o papel de gestão se tornou um papel de cobrança, o que gerou atritos na convivência.

Outro ponto que foi levantado, foi a inconsistência do dia-a-dia dos núcleos familiares, que antes se uniam para atividades sociais com frequência, e cada vez menos o fizeram com o passar do tempo.

De lá até aqui, muito se transformou. Do ideal anarquista e revolucionário onde nasceu o co-living e co-housing, hoje o conceito se difundiu e se assemelha muito mais a um modelo de mescla de residência e hotel, numa aproximação do público-privado. Esse novo modelo surgiu em outro período, em São Francisco - EUA, relacionando-se ao surgimento das startups e novos negócios empreendedores de pequeno porte que reuniam diversas pessoas que buscavam residência acessível, serviços especializados e espaços comuns para trabalhar onde abrigariam esses negócios em incubação e espaços de lazer.

Apesar da iniciativa, ao oferecer serviços nomeados co-livings e co-housings é possível enxergar um modelo muito mais parecido com o visto em condomínios de casas da iniciativa privada, onde o aspecto coletivo se dá como um acesso a serviços e espaços extras, e não com o aspecto de convivência coletiva e da comunidade intencional, que definem a essência do co-living.

Referências:

ONE SHARED HOUSE. One shared house: a radical experiment in communal living. Disponível em: http://onesharedhouse.com/. Acesso em: 11 out. 2018.