Durante uma vivência de um dia, convidei moradores de casas compartilhadas a dividir suas experiências pessoais em uma atividade coletiva, compreendendo seus pensamentos e as dores que sentiram ao viverem nesses espaços . As atividades podem ser divididas em três etapas, sendo a primeira uma dinâmica de brainstorming, com intuito de aguçar a criatividade e imergir os participantes no universo dos espaços, objetos e atividades relacionados ao ambiente doméstico; seguido por uma discussão complementar sobre a atividade, que serviu como um grupo focal; e por último, a co-criação de um protótipo de modelo de organização para a casa compartilhada.

A experiência de co-criação, é uma metodologia para o desenho de novos produtos e serviços que se fundamenta no potencial de colaboratividade e compartilhamento de ideias e vivências por pessoas de diferentes perfis e que possam transparecer dores reais e situações que formarão os roteiros de mapeamento da jornada da experiência do usuário durante uma atividade. Além das informações coletadas durante o laboratório, essa atividade proporciona uma camada extra ao processo: coloca os usuários como idealizadores de um protótipo de baixa finalidade.






Objetivos:

Seis pessoas foram convidadas a participar da vivência, por possuírem experiências relacionadas ao problema que o produto propõe solucionar. Ao colaborar com suas experiências e insumos reais para o projeto, viabilizando assim a compreensão de cenários reais e expectativas relacionadas à vivência em uma residência colaborativa, além da definição de um processo que lhes parecesse justo e eficaz para as definições dos alicerces da criação de uma comunidade intencional autônoma.






Desenvolvimento:

Com início pela manhã, a atividade se inicia com um café-da-manhã e uma conversa despojada. Após a integração maior dos convidados se inicia a primeira atividade: um brainstorming dividido em três etapas.

A ideia inicial era mapear numa primeira etapa os espaços que compunham uma casa, no segundo momento, os objetos que pertenciam a esses espaços e por último, conectando espaços e objetos, mapear as atividades que se realizavam no espaço doméstico.

Como objetivo geral, essa atividade tinha como intuito o aprofundamento no assunto "casa", reflexão sobre os elementos que significam o espaço residencial e então uma discussão crítica sobre os pontos levantados anteriormente.






Espaços

Realização: A primeira etapa, foi colocado como objetivo o mapeamento de todos os espaços de uma casa. Como foi a primeira atividade do dia, foi oferecido um tempo maior* aos participantes para que pensassem em todos os espaços que lhes viessem à mente.



* Num primeiro momento, tive o receio de que em algum momento pudesse acontecer algum tipo de bloqueio na expressão das ideias e que poderia haver algum tipo de dificuldade de aderência a atividade.

Durante 5 minutos os participantes colocaram em post-its todos os espaços que poderiam pertencer à uma casa, a meu pedido, sempre explanando em voz alta aquilo que estavam pensando e escrevendo.

** Ao contrário do que eu imaginei, a atividade correu muito bem, e não houveram limites para as ideias e colocações. Pelo contrário, muitos cenários não-imaginados foram colocados nos post-its.

Resultado: 58 espaços mapeados. (Muito mais do que o esperado!)



Priorização dos espaços:
Com o grande volume de espaços mapeados na primeira etapa, senti a necessidade de filtrar os espaços para não estender demasiadamente as próximas etapas da atividade.
Para isso, pedi que votassem em 5 principais cômodos que consideravam importantes para a casa.



Resultado da primeira etapa:
Como conclusão, pude entender que os espaços comuns à casa são semelhantes às minhas presunções, mas nesse momento, pouco diriam sobre o aspecto comum de definição de casa.
Os espaços da primeira sessão auxiliariam no resultado das demais etapas.





Objetos:
A segunda proposta na atividade foi mapear os objetos que pertenciam a cada espaço da casa, selecionado anteriormente.
Com foco em um espaço por vez, durante 2 minutos, foram pensados todos os possíveis objetos que estariam dispostos no espaço.



Objetivo:
se aprofundar agora em uma camada mais profunda, imergindo no cotidiano doméstico e mapeando os detalhes, com uma camada maior de detalhe. Resultado: Muitos, muitos objetos mapeados. Muitos fora do lugar para alguns, e completamente normais para outros. Elementos específicos e elementos do senso comum.

Não houve padrão, a não ser um padrão individual. Alguns, foram mais práticos e diretos, pensaram nas rotinas e nos elementos-chave. Outros, buscaram momentos específicos e memórias mais íntimas.



Atividades:
Na terceira etapa do processo, convidei todos a unirem objeto e espaço a fim de mapear atividades. Os elementos descritos deveriam se tratar de ações, verbos. Nesse momento, percebi mais direcionamento e um afunilamento, necessário e premeditado. As ações foram específicas e determinavam hábitos e rotinas individuais.

Houve sim um padrão, com certas diferenças de comportamento individual, mas muito menor amplitude do que na etapa de mapeamento de objetos. O interessante de utilizar post-its, foi o fato que os participantes puderam mover os itens e agrupar ESPAÇO + OBJETO = ATIVIDADE.



Resultados observados:
Da imensa criatividade dos participantes, o resultado final demonstrou as infinitas possibilidades nas quais se podem configurar as casas compartilhadas. Como esperado, o espaços, objetos e atividades, podem variar de acordo com as necessidades individuais, sendo a grande maioria de interesse e senso comum. Porém, o interessante foi perceber como a inclusão de pontos individuais prevaleceu sobre a maioria. Não houve veto de ideia ou de necessidade, mas sim o diálogo sobre as ressalvas individuais, o que demonstra a necessidade dos diálogos e da construção de casa únicas, centradas em funcionamentos individuais que podem -e devem - variar conforme a composição de pessoas e espaços.

Em alguns momentos, prevaleceu um discurso sobre posse de objetos, direito de uso, e responsabilidade.

Entre as unanimidades do discurso, esteve a ideia de que alguns espaços, objetos e atividades são individuais e assim devem ser mantidos. Outros elementos, eram considerados coletivos e o compartilhamento deveria ser facilitado, mas não exigido. Os participantes do workshop nomearam esses elementos de 'whatever'. Numa terceira categoria estavam principalmente inseridas algumas atividades, que garantem o bom funcionamento da casa e suas atividades, essas deveriam ser fator obrigatório, porém em outras circunstâncias poderiam ser distribuídas de outras maneiras, sem que todos participassem.

Transcrição dos principais pontos do grupo focal

"Direito de uso"
Como os espaços influenciam na divisão dos objetos e tarefas?
O direito de uso ou não uso está mais conectado à atitude das pessoas em relação aos objetos, do que ao uso em si.
Por exemplo, o cuidado com os objetos e conservação, pode ser o fator determinante para que alguém permita que o objeto seja compartilhado ou não.
Os objetos em espaços compartilhados, podem ser de uso individual?
Para não ter esse problema, podem ser criados espaços individuais dentro dos espaços coletivos.
Por exemplo: uma prateleira individual em um espaço coletivo, para armazenar itens que as pessoas não desejam compartilhar.
Se o objeto é individual, deve ser questionado para os demais, se pode ser armazenado no espaço coletivo. Da mesma maneira é necessário que se evite levar itens do coletivo para o espaço privado.

Coletivo - Semi-coletivo - Individual

O que é seu, o que é nosso?
"Como eu vou poder tomar uma água no meu quarto?"
Pode levar ao quarto, porém não pode deixar no quarto.
A questão é o uso adequado.
Uso imediato - usar e devolvido da mesma maneira que foi encontrado.
Se está no espaço coletivo, não é necessário devolver.
"O individual pode ser emprestado, porém sempre devolvido".
"Existem espaços individuais dentro do coletivo".
"Objetos do coletivo, podem ser utilizados pelo individual, porém devolvidos ao seu devido lugar."
Outro fator que define o que é individual e coletivo, o fator de quem levará o objeto em caso de mudança, tem uma relevância.
Seria interessante ter um "quartinho de bagunça", um espaço para armazenamento de coisas diversas.
Tanto individuais, quanto coletivas.
Um sistema de etiquetas, poderia funcionar para identificar os itens que pertencem a cada um.
No caso dos animais de estimação, é importante que os moradores estejam de acordo com a presença e os cuidados necessários para cuidar e manter o animal.
O dono de uma animal -quando indivíduo- pode ser responsabilidade de uma única pessoa.
É importante que o grupo tenha autonomia.
É fundamental que existam reuniões coletivas para que as decisões sejam tomadas colaborativamente

Divisão das tarefas
Uma pessoa limpa todos os espaços e se não concluir a tarefa, paga-se uma multa Cada um limpa um cômodo, rotacionando os espaços.
Ao limpar todos os espaços, as pessoas aprendem a fazer o melhor uso do espaço. Existem espaços semi-coletivos?
Banheiro, oficina.
São espaços que apenas algumas pessoas usam.
Existem vários tipos de sistemas e em diferentes repúblicas e alguns funcionam ou não. O importante é o autoconhecimento para definir as melhores metodologias.
O caso de uma casa. É como uma empresa.
Se pagar o aluguel atrasado, mesmo que ainda não tenha multa. A pessoa paga multa.
- Um cômodo de cada vez, marcando o que foi feito e é dividido igualitariamente.
O ideal seriam todos limpando ao mesmo tempo, todos os cômodos.
Quanto maiores as micro-comunidades, é maior a administração e divisão de tarefas. Com um número maior de pessoas, é necessário centralizar a gestão do espaço.
A questão social
Existe uma exigência em compartilhar momentos de convívio social com os habitantes da casa?
"Quando você topa morar com uma galera, você tem que socializar com todo mundo"